Pieces of me (pedaços de mim)


“Oh! pedaço de mim, oh! metade de mim”...

Chico Buarque de Holanda


A bela canção de Chico Buarque, o poeta feminino por excelência, seria a melodia ideal para estar diante de “Pedaços de mim”, trabalho da artista Rachel Korman. Não somente pela fotografia que nos apresenta o próprio corpo da artista, fragmentado, esquartejado, mas também pela beleza que emana da imagem tanto quanto da melodia de Chico. Em ambos os casos, as obras nos deixam ver suas humanidades escancaradas. Nesta obra Rachel questiona os limites da existência humana, no caso, a feminina, buscando exibir-se como uma metáfora de como somos vistos. A pergunta é: sou inteira quando me vêem ou são apenas pedaços de mim que se apresentam?
No que tange à arte e sua história, a representação da figura feminina, desde as Pietás e Madonas até os nus das Vênus, sempre pareceu imagens femininas imateriais - míticas, sacras, nunca carnais. A mulher, musa inspiradora, sempre teve múltiplas origens, de rainhas às donas de casa, cortesãs, bailarinas, todas amantes, mulheres, mães, filhas retratadas como ideal inalcançável da beleza.
A mulher, que teve sempre que se contentar com o papel de musa, via-se representada apenas como ideal, faltava-lhe carne. A carnalidade, invenção dos românticos Ingres e Goya, no entanto pairava como mera representação. É somente na arte contemporânea com questionamento à psicologia da histeria feminina em Louise Bourgeois, na desconstrução do corpo em Judy Chicago,
Marina Abramovic e Eva Hesse, nos auto-retratos paródicos de Cindy Sherman,
no exibicionismo panfletário de Vanessa Beecroft, enfim, nas vertentes e dobras
da arte feminista, que a mulher pôde inserir sua verdadeira imagem na arte.

Em “Pedaços de Mim”, a artista busca responder à pergunta psicanalítica o que sou é reflexo de mim mesmo ou sou apenas fragmentos de como me vêem? A charada está lançada, cabe agora montar os pedaços.

Paulo Reis